De jornais e elevadores

Paula Leite

Por Rafael Andery, 23, trainee da turma 54

Às vezes é difícil escrever. O texto começa claudicante, sem ritmo, as ideias não fluem e você não consegue se expressar. É mais ou menos o que acontece agora com este que vos escreve. Felizmente para mim, não existe exatamente uma grande pressão editorial sobre o conteúdo do blog, de modo que disponho de muito mais tempo para escrever do que os colegas que labutam na redação.

Assombra-me diariamente, entretanto, a perspectiva de um dia encontrar-me sem ideias ou recursos literários para concluir um trabalho diário, corriqueiro. Nestes pesadelos noturnos vago por uma redação repleta de jornalistas que padecem de bloqueios criativos, com jornais em branco sendo impressos tão somente com anúncios comerciais produzidos por publicitários igualmente bloqueados. Noto feliz que a qualidade de algumas publicidades aumentou consideravelmente.

Mas bloqueio literário é coisa de escritor, não de jornalista. É o que venho observando ao longo dessas semanas de treinamento. Gabriel García Marquez e F. Scott Fitzgerald que me perdoem, mas redação não é lugar para uma frescura dessas. O ritmo de produção de um jornal diário não permite aos seus redatores muito tempo para contemplações e divagações. Tudo aqui é objetivo. Curto, sintético, claro.

Para quem cursou cinco anos de direito, acredite, é um choque. Evitar adjetivos, embromações e palavras pantagruélicas é precisamente o contrário do que funciona em uma prova de teoria geral do direito, por exemplo.

Foi por isso que uma atividade em específico do programa me chamou a atenção nesta semana. Trata-se de uma aula de oficina de texto. Estudamos a estrutura do texto de alguns grandes autores e procuramos entender como isso se encaixa no cotidiano do jornal. Confesso que às vezes me custa compreender. O texto jornalístico ocasionalmente preza muito pela padronização. Fica fácil de ler, mas difícil de fruir.

Em uma das atividades da oficina, fizemos um exercício aonde deveríamos descrever uma foto. Uma paisagem, um retrato, uma cena de filme, eram várias as opções. Optei pelo retrato. A dificuldade de achar a palavra certa, de encadear os elementos contidos naquela foto em uma ordem lógica e simples me deixaram aliviado por não ter que viver de escrever romances, mas antes notícias.

Escrever uma reportagem em um jornal diário é mais um procedimento de seleção e edição das informações apuradas do que propriamente um processo criativo. Para o leitor, o texto deve informar antes de agradar. Sua efemeridade o torna uma espécie produto descartável, que dissolve no tempo. É um trabalho de Sísifo. Todo dia haverá algo novo a relatar.

É possível comparar um texto de jornal a um elevador. O importante é que funcione, ainda que sua linguagem seja simples. Garanto-lhe que dez entre dez pessoas escolheriam um elevadorzinho humilde, sem espelhos ou música ambiente, mas que suba 14 andares sem problemas a um colosso espelhado, com ar-condicionado e ascensoristas de luvas, mas que nunca pare no andar certo.