Colunista deixa The Guardian após ameaças e acusações de transfobia

(Reprodução)
treinamento

Após mais de 20 anos como colunista do The Guardian, a jornalista Suzanne Moore, 62, anunciou sua saída do jornal britânico no último domingo (16). O anúncio foi feito por meio de uma rede social e seguido de comentários de seus leitores, alguns inclusive cogitando deixar de apoiar financeiramente a publicação.

Moore é conhecida por seu posicionamento à esquerda e a defesa do feminismo, tema que aparecia muito ​em suas colunas. O episódio que deu início ao mal-estar entre a colunista e o jornal e culminou em sua saída começou meses antes.

No início de março, Moore publicou o texto “Mulheres devem ter o direito de se organizar. Não seremos silenciadas”, em que criticava um episódio no qual a professora da Universidade de Oxford Selina Todd foi “desconvidada” de um evento em razão de divergências de opinião que tem com o transfeminismo, corrente que trata das demandas de mulheres transexuais e travestis. A BBC News falou sobre o caso.

Na coluna, Moore caracterizava o episódio como um silenciamento e dava sua opinião sobre as categorias de sexo e gênero: para ela, o primeiro é algo material, não construído socialmente, ao contrário do segundo.

“Sexo não é um sentimento. Fêmea é uma classificação biológica que se aplica a todas as espécies vivas”, diz o texto. Moore afirma que o sexo é algo que impõe camadas de violências às mulheres, como a sexual, e, portanto, os direitos femininos devem levá-lo em consideração.

O texto despertou críticas nas redes sociais que acusavam a inglesa de transfobia. Entre a própria equipe do The Guardian houve manifestações. Poucos dias após a publicação da coluna, uma carta assinada por 338 funcionários do jornal —entre jornalistas, membros da equipe editorial, comercial e digital— foi enviada à editora-chefe, Katharine Viner, criticando o material.

“A publicação de conteúdo transfóbico interfere em nosso trabalho e deixa nossa reputação como hostil aos direitos trans e aos funcionários trans”, diz um trecho do texto, que o BuzzFeed News publicou na íntegra.

Em resposta à carta coletiva, Moore criticou no The Spectator —uma revista semanal britânica— a postura do Guardian de não apoiá-la e explicou que retomou o tema polêmico em sua coluna seguinte.

“Quero que seja verdade que sexo é uma categoria tão fluida quanto gênero, mas essa não tem sido minha experiência”, disse a jornalista na ocasião.

Desde os episódios, o assunto e as acusações de transfobia seguiram nas redes sociais, mas Moore continuou publicando suas colunas, que nos últimos meses versaram sobre a pandemia, o primeiro ministro Boris Johnson e as eleições norte-americanas.

No domingo (16), quando anunciou sua saída, a inglesa afirmou que foi sua a decisão, e que “os esforços para me calar parecem não ter sido muito bem pensados”.

Colegas jornalistas também questionaram sua saída.

No The Spectator, o editor Alex Massie, ao falar sobre a saída da jornalista, sugeriu que os comentários feitos nas redes sociais têm influenciado mais do que deveriam as decisões editoriais na era digital.

Suzanne Moore chegou a descrever em uma de suas colunas que vinha sofrendo ameaças virtuais. “Eu sei, por experiência própria, as consequências de ser considerada transfóbica por um comitê invisível nas redes sociais. Isso tem se traduzido em ameaças de morte a mim e a minhas filhas (…)”.