Influenciadores digitais patrocinados por restaurantes comprometem crítica gastronômica, diz artigo
Keia Mastrianni faz críticas de restaurantes há quase uma década e até então nunca tinha presenciado tal cena: 25 convidados para a inauguração de um estabelecimento em absoluto silêncio. Nessa reunião, apenas três pessoas eram especializadas em cobertura gastronômica e o resto era influenciador digital. O silêncio se deu pela imersão da maioria em seus próprios celulares, filmando e buscando o melhor ângulo para fotos.
Em seu artigo “The Case for Food Criticism in Charlotte” para o site da revista Charlotte Magazine, a jornalista questiona a importância da crítica gastronômica em uma era marcada por influenciadores digitais.
O principal choque de Mastrianni vem do contraste entre suas coberturas anteriores, em que havia a possibilidade de fazer perguntas e uma maior flexibilidade para provar os pratos, e a apatia vista na abertura do restaurante Lincoln Street.
Para ela, é notável que sempre existiu um interesse dos restaurantes por trás desses eventos para a mídia. Porém, antes da era dos influencers, havia uma espécie de balança entre o desejo de promover o estabelecimento e o dever dos jornalistas de informar os leitores, mais do que agradar as fontes em troca de dinheiro, comida e seguidores.
A autora diz que, atualmente, o que se passa por informação consiste em fotos cuidadosamente coreografadas e vídeos para os feeds das redes sociais.
Segundo Mastrianni, a função da crítica gastronômica é fazer uma avaliação justa que auxilie os consumidores a escolher onde comer fora e incentivar os restaurantes a melhorarem.
Mastrianni conversou com Helen Schwab, que foi crítica de restaurantes da The Charlotte Observer’s por 29 anos, e diz seguir um código de ética restrito: ela paga por suas refeições, usa pseudônimos para se identificar e visita o restaurante pelo menos duas vezes antes de escrever sobre. “O que está acontecendo agora é que os restaurantes estão divulgando sua própria mensagem”, diz Schwab.
Para Mastrianni, quando os influenciadores se tornam fontes primárias de informações sobre restaurantes, os clientes tendem a confundir o que é opinião do que é patrocínio, e isso resulta num crescimento da desconfiança.
A jornalista também falou com Allie Papajohn, que possui mais de 53 mil seguidores em sua conta no Instagram, onde posta frequentemente sobre comida. “Eu odeio dizer que fui paga para postar, mas é isso que acontece. Porém, estou sendo paga para postar sobre coisas que eu realmente gosto”, disse Papajohn. A influenciadora costuma diferenciar os posts pessoais dos pagos com uma tarja de “patrocinado”.
Mastrianni explica que um bom crítico é o que busca um relacionamento genuíno com os leitores, oferece uma voz singular e um ponto de vista consistente, independente se os consumidores amam ou odeiam o que foi dito. Ela acredita que é possível criar esse tipo de público nas mídias sociais, mas apenas com transparência.