Bolsistas da Universidade de Michigan conhecem Zé Celso e o Teatro Oficina

treinamento

Por Silas Martí

 

Em viagem ao Brasil, os integrantes do programa Knight-Wallace Fellows, bolsa de estudos para jornalistas coordenado pela Universidade de Michigan e que tem parceria com a Folha, visitaram alguns marcos arquitetônicos de São Paulo.

Na porta do Teatro Oficina, o grupo esperava para ver o espaço que o diário britânico “The Guardian” chamou de melhor teatro do mundo no fim do ano passado. José Celso Martinez Corrêa, que fez desse lugar no Bexiga, centro paulistano, um dos pilares da contracultura e de vanguarda nas artes cênicas desde os anos 1980, saiu na calçada e cumprimentou a turma. Logo depois, mandou escancarar as portas do Oficina e pediu que entrassem.

“Onde está o palco?”, perguntou uma jornalista turca. “Isso é o palco”, respondi, enquanto caminhávamos sobre a trilha de madeira que atravessa de ponta a ponta, como uma rua, o espaço desenhado pela arquiteta ítalo-brasileira Lina Bo Bardi (1914-1992). Um pouco antes da visita ao Oficina, os jornalistas haviam passado pelo Masp, outro projeto da arquiteta, e já começavam a entender que o grande lance em suas obras é a transparência.

Zé Celso fala para os fellows do
Zé Celso fala para os integrantes do Knight-Wallace Fellows (Foto: Joel Silva/Folhapress)

Todos ficaram impressionados com a janela imensa na lateral do teatro que revela o que, por enquanto, ainda é um terreno vazio ao lado do Oficina. Há duas semanas, uma reportagem da Folha revelou que o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional deve autorizar o braço imobiliário das empresas do apresentador Silvio Santos a construir três torres de 28 andares ali, o que mergulharia na penumbra o interior luminoso do teatro —para os novos prédios saírem do papel, no entanto, órgãos de preservação do patrimônio do Estado e do município precisam estar de acordo com a permissão em nível federal.

Essa batalha, que se arrasta há mais de duas décadas, foi o principal assunto de Zé Celso com os jornalistas da Universidade de Michigan. Ele chamou todos de “correspondentes de guerra, uma guerra pela cultura”. Falando em português, o dramaturgo teve suas palavras traduzidas em tempo real para o inglês por Rodrigo Andreolli, um dos atores de sua trupe.

Numa espécie de discurso-performance, Zé Celso mostrou a árvore plantada no interior do teatro por Lina Bo Bardi e detalhes da estrutura do prédio, que seria a fusão de um terreiro de candomblé e uma ópera italiana. Enquanto falava, outros atores de sua companhia Uzyna Uzona subiam e desciam pelos andaimes que envolvem a plateia do Oficina —a piada entre os jornalistas era como será que o teatro faz para pagar o seguro desses atores que se arriscam se pendurando nas alturas.

Depois da palestra, Zé Celso e seus atores levaram o grupo para conhecer o terreno ao lado do teatro, espaço que agora disputam com o Grupo Silvio Santos. Nas laterais do terreno, marcaram onde os muros devem ser derrubados, abrindo o lote para as ruas do entorno, como Abolição e Japurá, lembrando que Bo Bardi imaginara um teatro que ficasse no cruzamento de uma arena livre no meio da cidade, uma espécie de ágora ou anfiteatro.

Outra pergunta que se repetiu muito entre os fellows era qual seria a chance real de Zé Celso conseguir o que quer. E ele voltava sempre a dizer que essa se trata de uma guerra que precisa de seus correspondentes.