Grandes jornalistas escolhem o melhor filme sobre a profissão
Bastidores de um grande caso, reflexões sobre o papel da imprensa, o processo exaustivo de apuração — o que é mais importante em um bom filme sobre jornalismo?
O Novo em Folha perguntou a 20 jornalistas qual filme ou série melhor representa a profissão. Foram mencionados clássicos como “Cidadão Kane” e “A Montanha dos Sete Abutres” e outros mais recentes, como “Quase Famosos” e “Frost/Nixon”.
Com 25% dos votos, o vencedor foi “Todos os Homens do Presidente”. Baseado no livro homônimo, conta como os repórteres Bob Woodward (Robert Redford) e Carl Bernstein (Dustin Hoffman), do “Washington Post”, investigaram o caso Watergate, em 1972.
O filme, lançado em 1976 e dirigido por Alan J. Pakula, recebeu quatro prêmios Oscar, incluindo a de melhor ator coadjuvante. O prêmio foi para Jason Robards, que interpretou o editor-executivo do “Post”, Ben Bradlee.
No próximo dia 28, “Spotlight” concorre ao Oscar de melhor filme, mas não foi o vencedor na enquete abaixo.
Alon Feuerwerker, analista de política e comunicação, da FSB – “Intrigas de Estado”
“Bem identificado com os impasses do jornalismo, com ênfase em detalhes da nossa era digital. A contradição entre jornalistas velhos, habituados a apurações cuidadosas, e novos, guiados pela primazia da velocidade. A contradição entre o impresso e o digital. A contradição entre a fidelidade à notícia e as amizades. Essas e outras tensões fazem a qualidade do filme.”
André Barcinski, blogueiro e crítico cultural – “Todos os Homens do Presidente”
“Mostra não só o processo de investigação de uma grande reportagem como toda a luta de bastidores que envolve a publicação de notícias tão importantes, incluindo a pressão sofrida pelo jornal e pelos jornalistas.”
André Forastieri, diretor de novos negócios do R7 – “A Primeira Página”
“Retrata o eterno conflito do repórter entre o jornalismo e a publicidade, hoje mais relevante que nunca, com tanto ‘conteúdo’ disfarçado de notícia. E zoa com o papel do editor— sempre um manipulador…”
Andrew Greenlees, vice-presidente da CDN Comunicação – “Frost/Nixon”
“Retrata a complexidade de conseguir/preparar/executar uma entrevista, um dos elementos básicos do jornalismo. E uma boa entrevista é um achado. Esse filme retrata a tensão entre convencer o personagem a dar a entrevista e, ao mesmo tempo, conseguir manter uma postura crítica em relação a ele.”
Barbara Gancia, apresentadora do “Saia Justa” – “A Primeira Página” / “A Montanha dos Sete Abutres”
“A realidade anda superando a ficção, dependendo da versão que você for ler, é claro. Dependendo do grau da urgência, uma história bem-contada vale mais do que fatos. Será?”
Bernardo Mello Franco, colunista da Folha – “O Ibrahim do subúrbio”
“É uma comédia brasileira de 1976, com direção de Cecil Thiré. O filme não trata do cotidiano dos jornalistas, mas mostra como o jornal mexe com vaidades e pode ter um papel central na vida do leitor comum. O protagonista é um alfaiate do subúrbio do Rio que sonha em emplacar o casamento da filha na coluna social de Ibrahim Sued. Acho que todo repórter já esbarrou com personagens parecidos com Casimiro, vivido por José Lewgoy. A produção é pouco lembrada, mas está no YouTube.”
Carlos Eduardo Lins da Silva, editor da revista “Política Externa” – “Spotlight”
“Nele, o jornalista não é retratado nem como herói nem como vilão, mas sim como uma pessoa que tenta fazer seu ofício de acordo com os códigos profissionais de comportamento e que às vezes acerta, às vezes erra, como a maioria absoluta dos seres humanos em suas respectivas atividades.”
Carlos Maranhão, ex-diretor de Redação da “Veja SãoPaulo” – “Todos os Homens do Presidente”
“Não há repórter que não se sinta inspirado por Bob Woodward e Carl Bernstein nas magníficas interpretações de Robert Redford e Dustin Hoffman — nem editor que não se torne admirador do Ben Bradlee que Jason Robards recriou com tanta competência. Eles nos dão lições inesquecíveis de jornalismo, tenacidade e coragem.”
Claudia Antunes, repórter – “Profissão: Repórter”
“O filme de Antonioni traduz bem a angústia que às vezes nos acomete: por que estou fazendo essa matéria? Será que estou relatando isso aqui da forma mais justa, mais fiel à realidade? Consigo mostrar os interesses envolvidos?”
Clóvis Rossi,colunista da Folha – “Todos os Homens do Presidente”
“Conta uma história real de tremenda importância política, mas é bom deixar claro que a profissão de jornalista, no dia a dia, tem bem menos glamour do que o cinema em geral mostra.”
Frederico Vasconcelos, repórter especial da Folha – “Todos os Homens do Presidente”
“Na época do lançamento, retratou bem as condições essenciais para uma reportagem investigativa profunda e desafiadora: tempo suficiente de apuração, trabalho de equipe, checagem e rechecagem das informações, fontes confiáveis para avaliar e confirmar os dados levantados, além do apoio e retaguarda dos editores e da direção. Sem essas duas últimas condições, o jornalismo investigativo de fôlego pode ser esforço inútil ou aventura arriscada.”
Igor Gielow, diretor da sucursal de Brasília da Folha – “A Montanha dos Sete Abutres e “O Informante”.
“Empatam ‘A Montanha dos Sete Abutres´ e ´O Informante´ (só pela cena final, com o Unabomber virando notícia).”
José Roberto de Toledo, repórter e colunista de “O Estado de S. Paulo” – “Cidadão Kane”
“Apesar de tratar pouco ou quase nada do dia a dia da Redação, ‘Cidadão Kane’ é preciso ao mostrar as relações de poder. E, nisso, ainda permanece atual, sobrevivendo à revolução digital, por enquanto.”
Luiz Rivoiro, editor-chefe do “Metro” – “The Newsroom”
“Em três temporadas, mostra as dificuldades e os dilemas enfrentados por um grupo de jornalistas capitaneados por um editor brilhante (mas nem por isso perfeito) para produzir um jornalismo crítico e autêntico em um ambiente minado por interesses comerciais numa realidade em permanente transformação.”
Leão Serva, colunista da Folha – “Bem-vindo a Sarajevo”
“Os diversos jornalistas retratados no filme compõem um bom quadro tanto das contradições ou diferentes opções diante de uma encruzilhada, quanto das forças e fraquezas dos profissionais.”
Paulo Sampaio, repórter da revista “Joyce Pascowitch” – “A Montanha dos Sete Abutres”
“Um clássico. Situação plausível, verossímil, tem ritmo de redação, boicote, sacanagem. Adoro.”
Renata Lo Prete, editora de política da Globonews – “Quase Famosos”.
“Não sei qual é o melhor. Gosto de muitos da lista. Então vou ficar com ‘Quase Famosos’. Além de uma descrição precisa do conflito acesso x distanciamento crítico e da trilha sonora lindinha, o filme contém minha recomendação favorita para os praticantes do ofício: ‘Be honest and unmerciful’.”
Sérgio Dávila, editor-executivo da Folha – “Todos os Homens do Presidente”
“Dos filmes de jornalismo, para mim, este é o ‘Cidadão Kane’ (que aliás também é um filme sobre jornalismo). É o que se aproxima mais de mostrar como nosso trabalho é na maior parte dos casos desprovido de glamour e quase sempre fruto de insistência e paciência —o que os mais antigos resumem como “gastar sola de sapato”. Mostra também como, às vezes, o bom jornalismo pode ajudar a mudar a história.”
Thomas Traumann, ex-porta voz da Presidência e ex-ministro da Secretaria de Comunicação – “A Montanha dos Sete Abutres”
“É a melhor alegoria no cinema para as distinções entre furo, interesse público e sensacionalismo.”
Valdo Cruz, repórter especial da Folha – “Spotlight”
“De todos que vi, não sei se porque acabei de assistir, ‘Spotlight’ é o mais verdadeiro sobre a nossa profissão.”