‘Look’ sem graça dos jornalistas rouba a cena em ‘Spotlight’

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O filme “Spotlight”, que aborda a cobertura do jornal “The Boston Globe” sobre o abuso sexual de crianças na Igreja Católica, chamou a atenção dos críticos em sua estreia nos EUA, na última semana.

O figurino, baseado na roupa dos verdadeiros jornalistas envolvidos no caso, causou furor por outra razão: captou extraordinariamente bem o estilo (ou, melhor dizendo, a falta do estilo) que ainda distingue os jornalistas e editores hoje.

A figurinista do filme, Wendy Chuck, uma veterana da sutileza do vestuário em filmes como “Sideways – Entre Umas e Outras” e “Crepúsculo”, falou ao “New York Times” sobre o que é a “Redação-chique” e os desafios de transformar estrelas hollywoodianas em jornalistas. Veja trechos:


Como descreveria o estilo dos jornalistas?
É um vestuário colocado sem pensar. Como se fosse uniforme escolar. É como se você tivesse coisas mais importantes em que pensar. Mostra que você está confortável, que ninguém vai comentar sobre sua aparência. Não vai ofender ninguém.

E isso foi difícil de capturar?
Não, mas é difícil fazer com que uma roupa terrível continue terrível quando for usada por pessoas muito famosas, que sempre são glamorosas, especialmente Rachel McAdams (que faz a Sacha Pfeiffer).

Como conseguiu isso?
Com o corte e a cor da roupa. Esses caras não queriam saber de roupa, pareciam estar presos numa cápsula do tempo, algo assim. Por isso tentamos capturar a década de 1990, apesar de o filme se passar no começo dos anos 2000.
A ideia era ser autêntica. Tem que jogar fora os conhecimentos, fazer uma análise rigorosa das fotos do vestuário e tem que brigar com os atores. Também as marcas precisam ser corretas. Pode usar uma camiseta folgada, mas ela tem que ser justa na gola, porque nossos olhos estão acostumados a ver esse tipo de coisa no cinema.

Você se baseou nas verdadeiras roupas dos jornalistas?
Sim, totalmente. Tom McCarthy, o diretor do filme, me colocou imediatamente em contato com todos os jornalistas. Mike Rezendes, um deles, mandava fotos da jaqueta de couro, que usa até hoje, e dos seus Doc Martens. Eu perguntava onde eles conseguiram essas coisas e ouvia sempre “minha mulher compra para mim”. Há algo tão generoso no espírito dessas pessoas. Meu impulso foi homenagear o jornalismo.

Costurou ou comprou as roupas?
Costurei algumas, principalmente as de Rachel porque não achei o que queria. Algumas dos caras encontrei em brechós, e fiz várias visitas ao “Brooks Brothers” [um dos mais antigos outlets para homens nos EUA]. Às vezes, me considero jornalista. A roupa é um tipo de linguagem breve e rápida, acertar nisso ajuda a contar a história. Aprendi qual é o uniforme de Boston: uma camiseta de botão azul, calças-cáqui e sapatos marrons.

Você ficou surpresa com a pequena polêmica causada pelo figurino do filme?
Sim, houve um burburinho já quando começamos a filmar dentro do prédio do “Boston Globe”. As pessoas começaram a ver Rachel com roupa folgada, e recebemos comentários positivos e alguns negativos. Mudei um pouco, deixei a roupa menos folgada para que não ficasse cômica. Obrigada, Twitter!

Enfrentou muita resistência?
Foi uma brincadeira constante entre os atores. Havia muita resistência. Não quero mencionar nomes, mas eles sabem quem foi. Muito: “Não, não, não posso [vestir isso]!”
Acharam a roupa era folgada demais, que não era normal. E isso depois que eu modifiquei as camisetas.