Por Júlia Marques, trainee de ciência e saúde
“Cuidado para não virar ‘boy’ de aspas”. A recomendação é de um professor que me acompanhou durante boa parte da minha graduação. Ele se referia com propriedade àquele jornalista que sai para uma entrevista como um motoqueiro para buscar uma encomenda. Depois de colocar o gravador na boca do entrevistado e pedir que ele comente sobre o assunto X, o jornalista volta, vitorioso e apressado, com seu pacotinho em mãos para a Redação: um bocado de aspas –contundentes, de preferência.
Durante essa semana, em que nós –trainees de ciência e saúde–, estamos apurando pautas para as reportagens finais, fiquei pensando sobre o poder das famigeradas. Boas aspas podem render o título de uma reportagem. Ótimas aspas acabam saindo na capa do jornal. Texto sem aspas parece texto sem apuração.
Atrás de entrevistados, cheguei a encaixar mentalmente, no meu “futuro-possível-texto”, as minhas “futuras-possíveis-aspas”, como se eu pretendesse que as fontes falassem exatamente aquilo que caberia melhor na reportagem. A vida não é assim. E a decepção sempre chega, dura como um travessão. E se vai, melancólica como as reticências.
— Ele não falou nada daquilo que eu queria que ele falasse…
Pobre do entrevistado que não produz boas aspas. É como a encomenda que chega toda amassada enquanto esperávamos um embrulho bonito com laço de fita.
Pobre, na verdade, de nós jornalistas, que às vezes somos reféns de aspas. Na caça às “duas vírgulas de cabeça pra baixo”, deixamos de ver as interrogações que caminham todos os dias pela cidade. E o silêncio, que também diz tantas coisas, permanece inaudível.