Lições do mestre Gay Talese
Anteontem o pai do “new journalism”, Gay Talese, veio à Folha conversar com os jornalistas.
Eis algumas das lições que ele deixou (leia tudo AQUI):
LITERATURA
“Quando era um menino na escola, lia contos, pequenos romances, e fiquei interessado nas narrativas. Mais tarde, me perguntei se eu poderia contar histórias, mas não com personagens imaginários, e sim reais. Não queria ser um repórter, mas contar histórias. Não precisava usar a imaginação, mas sim passar tempo com as pessoas.
Pessoas nem sempre contam a verdade. São cuidadosas, pois não conhecem o jornalista. Eu queria conquistar a confiança delas. E como fazer isso? Aos poucos.
Você conhece alguém na rede social, sai, almoça, passeia e ficam íntimos. Há um paralelo com o tipo de jornalismo que faço. Às vezes, nós, jornalistas, somos sedutores. E não quero ser o sedutor de uma noite só, mas sim um parceiro de uma relação.
JORNALISMO
Eu acho que jornalismo pode ser uma forma de arte.
Estudantes de jornalismo estão sempre reclamando que não têm emprego na área. Quando comecei, eu pegava sanduíches para o pessoal. Era o jeito de entrar.
Quem reclama que não tem tempo para um bom trabalho precisa arrumar esse tempo. Você não deve ser um repórter como qualquer outro. Tem que ter perseverança, ego e até arrogância.
Muitas vezes você escreve sobre pessoas famosas e não pode se sentir diminuído, como se estivesse falando com alguma pessoa extraordinária. Por isso, desde jovem me sentia importante.
LIÇÕES DE FAMÍLIA
Não tenho celular, não uso e-mail. Vou conhecer as pessoas. Minha atitude vem da minha família. Minha mãe tinha uma loja de vestidos e meu pai era alfaiate.
Aprendi com minha mãe: deixe as pessoas falarem, não as interrompa. Com meu pai: o que é feito à mão é melhor que o feito com máquina.
PERSONAGENS
Nunca quis escrever sobre notícias do dia, o que os economistas ou políticos disseram hoje. Queria escrever notícias não importantes, mas escrevia tão bem que saía no jornal.
Quero escrever sobre pessoas que não estão nas notícias. Elas refletem a sociedade e quero ser o cronista de suas vidas. No “New York Times”, fiz de tudo para ficar longe dos famosos. Sugeria um monte de desconhecidos, e o editor dizia: “Quem se interessa?”. Eu me interesso.
AUTOMÓVEIS
Uma vez fiquei um ano e meio num assunto para escrever um livro. Foi entre 1980 e 1981, era sobre a indústria automobilística. Viajei com um diretor da Chrysler, frequentei reuniões, fui até Tóquio. Mas decidi que não queria mais. Seria muito sensacionalista.
Escrevi sobre mafiosos. Escrevi sobre pervertidos. Eu os respeito porque não estavam se escondendo; mas o pessoal do automóvel não era o que dizia ser. E expô-lo seria sensacionalista.
VENDEDOR
Uma reportagem começa na curiosidade. Você decide escrever sobre algo. Por quê? Porque te deixa curioso.
Aí, precisa achar alguém e propor que ele colabore. Como? Com técnicas refinadas de vendedor.
É como vender um aspirador. Se a pessoa já tiver, insista para ela tentar o seu.
Sou polido, não forço a barra. Acredito que o que vou escrever tem valor, não é superficial. Chego na pessoa com boas maneiras, estou sempre de terno e gravata, não importa se é o presidente ou lixeiro.
Aqui, por exemplo, está todo mundo mal vestido, mas não é meu problema (risos).
REPORTAGEM
Você diz à pessoa que ela tem uma história significativa e pergunta se ela pode colaborar. Se ele estiver ocupada e tiver que ir ao dentista, você pergunta se pode ir com ela. Eu procuro situações. É a arte de sair com as pessoas.
MÉTODO
Não faço anotações enquanto a pessoa fala. Escrevo o nome, o dia, o local. Depois, no hotel, peço a máquina de escrever emprestada e escrevo tudo.
FIM DO IMPRESSO
Quando entrei no jornalismo, aos 20 anos, diziam a mesma coisa, diziam que a televisão ia acabar com o jornalismo impresso. “Está tudo na tela, para que ler no dia seguinte?”.
Não acredito que vá acabar. Mas tem que ser de boa qualidade. Bons textos vão sobreviver porque são bons.“
Sensacional a transcrição da entrevista do Talese. Lições para repensar mesmo a forma de entrevistar, como conduzir uma entrevista e por aí vai. Tenho feito muitas reportagens com gente simples, do campo. E confesso, às vezes, eu consigo extrair coisas muito melhores em off do que com o microfone ligado. E tento conversar, não entrevistar. Podemos seguir sim muitos conselhos do mestre…
É isso aí 😉
Muito bom, faz a gente repensar algumas coisas que fazemos diante de um entrevistado.
com certeza!
Amei! Mas queria mais… mesmo na Folha achei pouco:(
Beijos!
Eu tb queria mais! Ainda mais porque não consegui ir no dia 🙁